Judicialização da saúde: novas respostas para velhos problemas
Abstract
Há um caos na jurisdição da saúde decorrente da tensão entre uma dívida pública exorbitante e um dever constitucional atribuído ao Estado de satisfazer, dentre outros, o direito subjetivo dos cidadãos à saúde, o que, diante da massiva população brasileira e do exorbitante número de ações judiciais, implica elevados gastos públicos e corriqueiras frustações, as quais, por sua vez, reclamam a intervenção jurisdicional. Demonstra-se que o Poder Judiciário, paradoxalmente, contribui para o agravamento do preocupante cenário por meio de cinco fatores principais: o apego à fundamentalidade material dos direitos à vida e à saúde como razão única para a concessão de medicamentos e demais prestações à saúde, afastando-se a aplicação da legislação infraconstitucional contrária à concessão de todo e qualquer pretensão do direito à saúde; o subjetivismo, solipsismo ou individualismo dos juízes, presente na grande maioria das decisões; o entendimento equivocado sobre o que é e, também, acerca do conteúdo do chamado direito implícito ao mínimo existencial; incompreensão teórica acerca da amplitude da cláusula da reserva do possível; e violação cotidiana ao princípio constitucional da isonomia e desprestígio de sua força normativa. Uma resposta meramente teórica para esses problemas (ausência de direitos absolutos, adoção do método da decisão por princípio dworkiana, correta compreensão técnica sobre mínimo existencial e cláusula da reserva do possível e resgate da força normativa do princípio da isonomia), porém, revela-se insuficiente ante a demanda por operacionalização e racionalidade do sistema. Assim, sob as lentes da Análise Econômica do Direito, apresentou-se alguns conceitos dessa disciplina que podem contribuir para a superação ou minoração dessa excessiva judicialização de causas relacionadas ao direito à saúde. A análise dos custos da transação, englobando o estudo sobre as Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDP), Fomento Setorial e Licenciamento Compulsório, demonstrou como é possível reduzir os gastos públicos na área da saúde sem deixar de atender à saúde básica dos jurisdicionados, assumindo a vontade política, no ponto, especial relevo para a concretização dos direitos. Evidenciou-se como a desjudicialização da saúde pode ser alcançada, também, por meio da adoção dos métodos alternativos de solução de conflitos, notadamente pela mediação sanitária, pelo estímulo ao uso de meios pré- processuais de resolução de conflitos na dispensação de medicamentos e tratamentos pela rede pública de saúde, pelo Poder Judiciário, através dos CEJUSCs. Abordou-se a necessidade de adoção do método consequencialista pelos tribunais superiores, o qual impõe a revisão da jurisprudência brasileira — mormente diante da reforma da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro pela Lei nº 13.655/2018, a qual consagrou expressamente o consequencialismo no direito brasileiro como método de decisão. Conclui-se que somente uma nova cultura jurídica pautada na necessidade de que os magistrados levem em consideração as consequências práticas potencialmente advindas de suas decisões, com análise da relação custobenefício, terá o condão de fomentar a superação dos problemas existentes no trato judicial da saúde. There is chaos in the health jurisdiction resulting from the tension between an exorbitant public debt and a constitutional duty attributed to the State to satisfy, among others, the subjective right of citizens to health, which, in view of the massive Brazilian population and the exorbitant number of actions judicial, implies high public spending and common frustrations, which, in turn, call for judicial intervention. It is demonstrated that the Judiciary Power, paradoxically, contributes to the aggravation of the worrying scenario by means of five main factors: the attachment to the material fundamentality of the rights to life and health as the sole reason for granting medicines and other health benefits; the subjectivism, solipsism or individualism of the judges, present in the vast majority of decisions; the mistaken understanding of what it is and, also, about the content of the so-called implicit right to the existential minimum; theoretical misunderstanding about the breadth of the possible reserve clause; and daily violation of the constitutional principle of isonomy and disregard for its normative force. A purely theoretical answer to these problems (absence of absolute rights, adoption of the decision method by Dworkian principle, correct technical understanding of the existential minimum and clause of the possible reserve and rescue of the normative force of the principle of isonomy), however, is revealed insufficient in view of the demand for operationalization and rationality of the system. Thus, under the lens of Economic Analysis of Law, some concepts of this rich discipline were presented that can contribute to overcoming or lessening this excessive judicialization of causes related to the right to health. The analysis of the transaction costs, encompassing the study on Productive Development Partnerships (PDP), Sectoral Promotion and Compulsory Licensing, demonstrated how it is possible to reduce public spending in the health area without neglecting the basic health of the jurisdicts, assuming the political will, on the point, special emphasis on the realization of rights. It became evident how the dejudicialization of health can also be achieved through the adoption of alternative methods of conflict resolution, notably by health mediation, by encouraging the use of pre-procedural means of conflict resolution in the dispensation of medicines and treatments. by the public health network, by the Judiciary, through CEJUSCs. The need for adoption of the consequentialist method by the higher courts was approached, which imposes the revision of Brazilian jurisprudence - especially in view of the reform of the Law of Introduction to the Norms of Brazilian Law by Law nº 13.655 / 2018, which expressly enshrined consequentialism in the Brazilian law as a decision method. It is concluded that only a new legal culture based on the need for magistrates to take into account the practical consequences potentially arising from their judicial decisions, with analysis of the cost-benefit ratio, will be able to foster the overcoming of the problems existing in the judicial treatment of health.